Dorme, dorme meu menino.
Esquece a dor que te incomoda, o desatino. Morde
firme as chupetas que te oferecem, não protestes. não grites, não chores, dorme.
Conta-me os teus sonhos para que os reescreva e possas sonhar baixinho, outra vez.
Diz-me dos pecados, ainda que pensados, para que te castigue e enfim te absolva.
Dorme, dorme meu menino.
Que a noite já lá vem e de mansinho.
Fazemos a nossa velha história.
Espreguiça-te nos dias acizentados do teu silêncio.
Contenta-te com a fartura que te ofereço, fabricada a oriente,
onde outros dormem um sono mais pesado do que o teu.
Consola-te nos jogos de poder. Acalma-te na rede à
procura do vazio. E se o vires, vira-te para o lado, não viste nada.
Dorme, dorme meu menino.
Eduardo Leal (1962- )
In "Em vez do silêncio"