quarta-feira, 31 de julho de 2013

Poesia de Ruy Belo no Brasil pela primeira vez

Já começou a chegar às livrarias brasileiras a colecção que reúne toda a bibliografia do poeta português, um dos maiores da segunda metade do século XX. E até ao fim do ano estreia um documentário.



Ruy Belo e Chico Buarque vão encontrar-se finalmente. O poeta português admirava o músico e escritor brasileiro, que não chegou a conhecer. Conta Teresa Belo, sua mulher, ao jornal O Globo, que o autor de Homem de Palavra(s) encomendava muitos vinis do cantor aos amigos que viajavam para o Brasil.
Belo interessava-se muito por nomes da literatura brasileira como Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e João Cabral de Melo Neto, mas Chico Buarque era Chico Buarque. “Ficava muito comovido com as canções e admirava a postura política dele”, lembra Teresa Belo.
Agora, o cantor e compositor, um dos mais populares da música brasileira, é um dos convidados de um documentário sobre o poeta português que será lançado no Brasil até ao fim do ano. Vai ler dois dos seus poemas, Orla marítima e Oh as casas as casas as casas. O documentário Ruy Belo, era uma vez, de Nuno Costa Santos, reúne críticos e escritores dos dois lados do Atlântico à volta deste homem que sempre cruzou a poesia com a política ou a espiritualidade e que viria a morrer em 1978, aos 45 anos, deixando versos como estes: “É triste ir pela vida como quem/ regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro”.



Deixamos aqui o poema "Ode Marítima" (referido na notícia) e sugerimos que conheça ou revisite a obra de Rui Belo existente na Biblioteca Municipal




ORLA MARÍTIMA

O tempo das suaves raparigas
é junto ao mar ao longo das avenidas
ao sol dos solitários dias de dezembro
Tudo ali pára como nas fotografias
É a tarde de agosto o rio a música o teu rosto
alegre e jovem hoje ainda quando tudo ia mudar
És tu surges de branco pela rua antigamente
noite iluminada noite de nuvens ó melhor mulher
(E nos alpes o cansado humanista canta alegremente)
«Mudança possui tudo»? Nada muda
nem sequer o cultor dos sistemáticos cuidados
levanta a dobra da tragédia nestas brancas horas
Deus anda à beira de água calça arregaçada
como um homem se deita como um homem se levanta
Somos crianças feitas para grandes férias
pássaros pedradas de calor
atiradas ao frio em redor
pássaros compêndios de vida
e morte resumida agasalhada em asas
Ali fica o retrato destes dias
Gestos e pensamentos tudo fixo
Manhã dos outros não nossa manhã
pagão solar de uma alegria calma
De terra vem a água e da água a alma
o tempo é a maré que leva e traz
o mar às praias onde eternamente somos
Sabemos agora em que medida merecemos a vida


Ruy Belo

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Poesia para todo o ano


CapaLivroPág.Crianças 6Julho


A poesia é anterior à própria escrita e nela a humanidade se exprimiu, desde tempos muito antigos, vindo depois a fixar em verso algumas das suas mais belas obras. Também para a criança a poesia é iniciática. Encanta-a a magia da palavra poética das rimas infantis mesmo antes de saber falar.”
É assim que Luísa Ducla Soares começa o seu prefácio a esta colectânea de poemas de autores portugueses, pensada para alunos do 1.º ciclo do ensino básico. Mas pode muito bem (e deve) ser lida fora da escola. A organização de Poesia para Todo o Ano é temática e a cada tema corresponde um ilustrador: poemas feitos de sons, letras e palavras; poemas simplesmente matemáticos; poemas para um corpo saudável e seguro; de valores e sentimentos; sobre nós e os outros; poemas de trazer por casa; para dias especiais; de tempos idos; da Terra e do Universo; da terra e do mar; dos seres vivos e, por último, poemas à volta de ideias e seres nunca vistos.
Há dois graus de dificuldade, assinalados com duas cores diferentes, isto para ajudar professores e educadores a adequar a escolha de leitura à maturidade da criança. A fechar a colectânea, o delicioso poema Coisas que não há que há, de Manuel António Pina. Um bom livro.
(Texto divulgado na edição do Público de 6 de Julho, na página Crianças.)

Deixamos aqui o poema de Manuel António Pina que encerra a colectânea.

Coisas que não há que há
Uma coisa que me põe triste
é que não exista o que não existe.
(Se é que não existe, e isto é que existe!)
Há tantas coisas bonitas que não há:
coisas que não há, gente que não há,
bichos que já houve e já não há,
livros por ler, coisas por ver,
feitos desfeitos, outros feitos por fazer,
pessoas tão boas ainda por nascer
e outras que morreram há tanto tempo!
Tantas lembranças de que não me lembro,
sítios que não sei, invenções que não invento,
gente de vidro e de vento, países por achar,
paisagens, plantas, jardins de ar,
tudo o que eu nem posso imaginar
porque se o imaginasse já existia
embora num sítio onde só eu ia…

 Fonte: http://blogues.publico.pt/letrapequena/2013/07/08/poesia-sempre/?utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=poesia-sempre